quarta-feira, 22 de outubro de 2014

esta manhã não lavei os olhos




0 sol dos sonhos derreteu-lhe as asas
E caiu lá do céu onde voava
Ao rés-do-chão da vida.
A um mar sem ondas onde navegava
A paz rasteira nunca desmentida...

Mas ainda dorida
No seio sedativo da planura,
A alma já lhe pede, impenitente,
A graça urgente
De uma nova aventura.

Miguel Torga
(in Poesia Completa,
vol. II)






[bati na
porta da vida
e disse-lhe:
não tenho medo
de vivê-la]



hoje o dia é só meu! ♕ ♔




domingo, 19 de outubro de 2014

hoje é domingo pé de cachimbo




Os quintais da minha infância insistiam em me enganar e me fazer mentirosa. Eu encontrava pé de tudo quanto é coisa: de abobrinha, de banana,de jabuticaba mas nunca o mais valioso de todos: o sonhado pé de cachimbo.Cresci com a memória da minha frustração em achar um pé de cachimbo. Vivi feliz com ela até o exato momento em que um primo sabichão me revelou o que para mim seria uma tragédia: “Hoje é domingo, pede cachimbo”. Pede? Como assim?...... Traidor domingo que pede cachimbo. Que pede o sentar-se descansadamente com o troço de madeira, osso ou sei lá o que mais entre os lábios. Pede, do verbo pedir, presente do indicativo, terceira pessoa do singular. O domingo pede cachimbo. Por que, domingo? Não podias ter pedido um bolo? Um suco detox? Um chinelo? Por que me traíste? Eu que te amava tanto. Que em tuas manhãs e tardes fazia nada e procurava pés de cachimbo pelos quintais, enquanto o mundo, lá longe, muito longe, se acaba nas insuportáveis intrigas de adultos. Por que me traíste pedindo o miserável cachimbo? Para mim, hoje ainda é “domingo, PÉ de cachimbo”. E que se dane o próximo domingo, o domingo (in)feliz, que com sua falta de criatividade se arrastara pedindo coisas e destruindo memórias.....



* musica aqui


**próximo domingo
segundo turno eleições presidenciais