quarta-feira, 5 de março de 2014

atrito de tempos








“A ordem do mundo está tão 
tumultuada que tudo é permitido 
– ou quase tudo.” 
 Jean Genet




   É possível afirmar que James Joyce foi um dos escritores que mais trabalhou com a desestabilização da forma literária. Ele afirmava que o leitor ideal para seus livros seria aquele que tinha a insônia ideal.    Eu aproveitei o carnaval para voltar pros  labirintos de Ulysses ( quase 1 ano  largado no fundo da gaveta) e me emocionar com sua personagem Molly. Ela expressa a coragem e rebeldia da mulher.   É aquela que podia ou teria querido casar melhor, é a que amou o esposo e não sabe se deixou de amá-lo, é a que o trai imaginariamente, é a que, no devaneio, recapitula amores, recapitulados também pelo esposo. A contagem do casal não coincide: ela não conta os quase-casos, ele os conta em parte, mas omite, ao que parece, alguns reais casos.   Molly é humaníssima . Educada para ser dona-de-casa, mas falha nas tarefas. A liberdade que ela se dá em falar do marido, da filha e dos amantes sem pudores, de ser mulher e sentir desejos e querer saciá-los, de ver em Bloom um companheiro que não exatamente faz o papel de 'corno manso', mas que entende o que ela quer – e que, também, não é nenhum santo.  Ela retrata a angústia  que os ansiosos têm antes de dormir, que é sem sentido, confuso e atrapalha o sono, que diz a si mesma tudo o que gostaria de estar gritando na rua para os outros.    A memória se faz nas rasuras, na tentativa absurda de se captar os fatos e sentimentos reais em um texto sem pontuação .  Ao final, Molly, antes de redormir, recapitula o dia e parte de sua vida, num fluxo psíquico, entre lúcida e ilúcida,  derramando monólogos  onde sutilmente mostra que  para não cairmos no esquecimento, temos de ter consciência do nosso próprio valor.     Se, ainda assim depois de tantas traduções, críticas, resenhas Ulysses é complexo, nós o somos em pé de igualdade, não fazemos sentido a maior parte do tempo. Isso não é, de forma alguma, ruim, é o que somos, como funcionamos....




Esses ensaios poéticos sobre literatura são maravilhosos, 
não deixe de ver este vídeo.



3 comentários:

mム尺goん disse...

[o livro vai sempre de um assunto sério para algo banal, grotesco e hilariante. eu preciso contar que o personagem ficava extasiado com os 'pums' que ela soltava na hora H , achava cheirosos e excitantes. nada que um repolho no jantar não possa auxiliar, não é??? imaginando o ato e rindo aqui. muito]

José Carlos Sant Anna disse...

É deste modo que conhecemos o outro lado da artista. Um belo exercício de crítica, revelando extrema sensibilidade no que disse e como o disse. Ah! e o vídeo... Ah! e o vídeo... Que maravilha de carnaval. Com Joyce... Apenas um pouco de inveja dele... Homem de sorte, ainda que do outro lado...
beijos,

lis disse...

Também gosto muito margoh
Ah os artistas _irreverentes e tão necessários!
beijo e obrigada pela 'leitura' preciosa.